Política

“Fake news não é liberdade de expressão”, diz Lídice

A deputada federal Lídice da Mata (PSB) fala sobre política e o trabalho na CPMI das Fake News

Tribuna da Bahia- Por: Guilherme Reis – Editor de Política; Henrique Brinco – Repórter e Paulo Roberto Sampaio – Diretor de Redação

A deputada federal Lídice da Mata (PSB) tem sofrido pressões por ser relatora da CPMI das Fake News no Congresso Nacional. A baiana defende uma regulamentação para o setor, que atualmente tem direcionado as estratégias políticas no país e ganhará um protagonismo ainda maior na pandemia do novo coronavírus. “Fake news é uma notícia fraudulenta. Portanto, não é liberdade de expressão. Em nenhum lugar do mundo é considerada liberdade de expressão. O que torna difícil, digamos assim, a legislação em torno dessa questão é que não há apenas um tipo de infração na postura dessas pessoas”, avalia a parlamentar, que também preside o PSB na Bahia, em entrevista à Tribuna. Segundo Lídice, os trabalhos da comissão estão suspensos temporariamente, mas o grupo continua recebendo sugestões e denúncias.

Questionada sobre os movimentos em torno da possibilidade de Jair Bolsonaro sofrer um impeachment, a pessebista avalia: “Isso não é uma coisa que se diga com exatidão. Há um isolamento do presidente, no ponto de vista político. E mesmo no Congresso, com as alianças que ele fez para garantir a possibilidade de não sofrer esse impedimento, está com um desgaste grande do presidente”.

Ainda na entrevista, a parlamentar afirma que os impactos da pandemia nas eleições municipais são indefinidos. “Isso vai depender de como estará a pandemia. Quem estiver fazendo qualquer plano que não leve em conta a necessidade de observar o avanço da pandemia, estará tomando a decisão errada. Nós, por enquanto, estamos fazendo o nosso mandato político via rede social. Então, todas as semanas temos reuniões com candidatos a vereadores, estimulamos o debate político sobre a cidade, também estamos discutindo programa de governo nessa direção. Então, é o que todos os candidatos farão. Ninguém poderá fazer mais. O candidato a prefeito, estando dentro da máquina da prefeitura, poderá estar tendo a possibilidade de uma movimentação maio”, pontua.

Tribuna da Bahia – A prisão de Queiroz e apoiadores bolsonaristas complicam a situação do governo e a crise política? O que podemos esperar?

Lídice da Mata – É claro que ela é negativa para o governo. Então, na medida que é negativa, ela complica a crise política, mas no sentido principalmente de desvantagem para o governo. O que podemos esperar eu não sei, não dá para dizer. Estamos em um ambiente muito indefinido por todas as razões. A primeira delas é a pandemia. Então, não dá para dizer hoje o que vai acontecer depois de amanhã no Brasil. Mas imagino que estamos vivendo no momento um governo que está com dificuldades, apesar de ter recuperado um certo apoio na Câmara. Ao mesmo tempo, está com um isolamento político na sociedade. Então, Queiroz é um complicador. Não tenho dúvida. Isso inclusive começou a ser divulgado pelas conclusões do ministério público.

Tribuna – Como estão os trabalhos da CPMI das Fake News? Aumentaram diante da enxurrada de conteúdo falso na pandemia?

Lídice – A Comissão está suspensa, como todas as outras da Câmara e do Senado. Mas, ao mesmo tempo, mantemos um trabalho administrativo de deferimento de requerimentos e, principalmente, um trabalho administrativo interno que faz com que a gente esteja conversando com os especialistas e acompanhando o debate do novo relatório do senador Coronel em relação ao projeto do senador Alessandro Vieira que atualiza a legislação sobre as fake news. Tudo isso traz a necessidade que a Comissão se mantenha permanentemente em trabalho, sobretudo a relatoria e a presidência. Os membros da Comissão mandam documentação, requerimentos e continuam atentos ao tema.

Tribuna – O trabalho do colegiado tem contribuído para que a PF e a Justiça fechem o cerco contra as chamadas milícias digitais?

Lídice – O conteúdo da CPMI é de domínio público. Os documentos que estão apresentados ficam todos nas páginas da CPMI. Imagino que o Ministério Público tenha acesso àquilo que foi produzido por nós. Além disso, do ponto de vista do Supremo, nós já solicitamos o compartilhamento de informações no primeiro momento, mas naquele momento eles consideravam que estavam em diligência e que não poderiam acatar porque o processo corria em segredo de justiça. Agora, estamos na expectativa que esse pedido seja reiterado pelo presidente e que eles possam partilhar conosco essas informações que serão fundamentais para o desenvolvimento do nosso trabalho.

Tribuna – Bolsonaro tem tido uma postura controversa em relação à CPMI e às investigações do STF. No dia que foi deflagrada a primeira operação, ele se dirigiu ao STF e ao Congresso, falou até palavrão, disse que “acabou” e tudo mais. Como a senhora interpreta essas ameaças? O Legislativo e o Judiciário estão sob ameaça de Bolsonaro?

Lídice – Todos estão sob ameaça, o Congresso, o Judiciário… Todos os aliados do presidente se manifestam contra essas instituições. Não é verdade dizer que o Judiciário que está sofrendo apenas críticas. Não é verdade isso. O Judiciário foi ameaçado, foram ameaçados os seus membros. As ameaças ficaram claras, inclusive, no voto do ministro Alexandre de Moraes. E essas ameaças partem de uma estratégia de intimidação dos membros das instituições democráticas, o Supremo e o Congresso – onde muitos também estão ameaçados. Coronel, por exemplo, sofreu ameaça de morte. E outros têm sofrido intimidação. E isso faz parte do modus operandi, ou seja, da forma como agem os bolsonaristas. Eles querem criar um clima de instabilidade democrática para que eles possam exercer o seu poder absoluto pelo medo.

Tribuna – A senhora chegou a sofrer algum tipo de ameaça direta?

Lídice – Direta desse tipo, não. Mas as ameaças chegam pelas redes com os ataques.

Tribuna – Alguns especialistas apontam riscos de essas leis atentarem contra a imprensa e a liberdade de expressão. Esse risco existe? Qual é o limite da liberdade de expressão?

Lídice – Fake news é uma notícia fraudulenta. Portanto, não é liberdade de expressão. Em nenhum lugar do mundo é considerada liberdade de expressão. O que torna difícil, digamos assim, a legislação em torno dessa questão é que não há apenas um tipo de infração na postura dessas pessoas. Além de inventarem notícias fraudulentas com o intuito de enfrentar alguém ou prejudicar a sociedade, também desenvolvem campanhas de ódio, campanhas intimidatórias, linchamento de biografias… Então, são uma série de crimes que estão muito próximos uns dos outros. A definição de cada um deles, ou uma tipificação de cada um deles, é algo complexo dentro do ambiente da rede. Por isso é que se diz isso. É que você pode, ao tentar fazer isso, prejudicar outras pessoas que atuem na rede. Por exemplo: algumas entidades da sociedade civil defendem a manutenção do anonimato da rede, que possam existir perfis de pessoas que utilizam pseudônimo e que não tenham a obrigatoriedade de ter um CPF ou endereço por trás disso. Há uma tendência no projeto de Alessandro Vieira de que isso fosse rompido. De que todo perfil tivesse que se apresentar e que a plataforma apresentasse a Justiça, se necessário, o CPF e o endereço. Então, são temas que vêm nessa direção, na dificuldade que tem. Nenhum país no mundo regulamentou porque justamente você está atuando em um ambiente de rede, que é novo e extremamente diferente do que se refere a comunicação no mundo até então.

Tribuna – Sobre o governo federal, existe margem e justificativa para impeachment, mesmo com os cargos que estão sendo dados ao centrão?

Lídice – Isso não é uma coisa que se diga com exatidão. Há um isolamento do presidente, no ponto de vista político. E mesmo no Congresso, com as alianças que ele fez para garantir a possibilidade de não sofrer esse impedimento, está com um desgaste grande do presidente. Agora, impeachment nunca é uma coisa definitiva. Isso faz parte de um movimento político que está dentro do Congresso e fora da sociedade. Nenhum impeachment foi conseguido de uma hora para a outra. Ele é um processo de debate interno, externo e leva a uma possibilidade de uma posição dessa.

Tribuna – O PT perdeu o protagonismo na questão do impeachment. Como a senhora vê isso? O PT ainda lidera a esquerda? Como a esquerda vai se reorganizar a partir de agora?

Lídice – O PT é o maior partido da esquerda brasileira. Então, ninguém pode deixar de levar em conta o PT. Tem a maior liderança política que foi produzida nos últimos anos no país. Portanto, não se pode deixar de levar em conta a existência de um líder popular como Lula. O que ocorre, no entanto, que há circunstâncias especiais nessa participação do PT – o que é muito natural. O PT teve uma presidente da República que sofreu um golpe, porque o impeachment apesar de ser um instrumento legislativo legítimo do presidencialismo no Brasil, por outro lado ela sofreu esse impeachment sem nenhuma comprovação de rompimento da Constituição e de rompimento legal. Isso está provado. Então, é por isso que eu creio que o PT sentiu a necessidade de analisar melhor no início para que ele pudesse analisar a repercussão sobre a sua própria história em relação a isso. Porém, o PT já aprovou nos seus fóruns de decisão de se incorporar a esse projeto e está na luta com outras entidades e partidos.

Tribuna – O ex-ministro Ciro Gomes tem se colocado como um contraponto a Fernando Haddad e ao próprio Lula, opções apresentadas pelo PT para 2022. Ele é um nome forte para a próxima eleição? O PSB teria um nome também a ser lançado?

Lídice – Está cedo para dizer isso. É claro que todo partido deseja ter um nome para a Presidência da República. Só que Presidência da República é algo mais complexo. É um nome que tem que surgir da luta política mesmo e está distante nesse momento. Temos agora as eleições de 2020. 2022 só acontecerá após 2020. É em 2020 o principal projeto político que o PSB tem nesse momento.

Tribuna – O PSB caminharia junto com o PT em 2022 novamente?

Lídice – Se nós não temos nem candidatura ou não, não tem como ter uma avaliação se vamos ou não com o PT. 2022 depende de 2020 do ponto de vista objetivo. Quais são as forças que emergirão a partir de 2020? Estamos construindo uma força ampla de frente democrática para combater as forças fascistas do nosso país. O que resultará, nós não sabemos ainda. Não dá para dizer quem vai estar com quem.

Tribuna – Acredita que as eleições de 2020 deveriam ser adiadas?

Lídice – Isso depende de uma avaliação epidemiológica, sanitária, da pandemia. Acho que hoje há uma grande possibilidade de ser adiada. A proposta que há na Câmara é realizar a eleição no início de novembro e o segundo turno no final de novembro, porém há outras propostas. Isso terá que ser decidido de acordo com a situação sanitária do país.

Tribuna – A senhora acha que a culpa pelo grande índice de contaminados vai cair no colo do presidente Bolsonaro ou prefeitos e governadores têm uma parcela de culpa nisso?

Lídice – Não é uma questão de parcela de culpa. Isso também é uma responsabilidade nossa, do povo, das pessoas admitirem o isolamento social como estratégia ou não. Agora, a omissão do governo federal em assumir o comando de forma consciente, respeitando a ciência e de maneira planejada, é claro que terá uma interferência muito grande na forma como a pandemia tem alcançado esses números tristes de mortes e falta de planejamento no Brasil. Se não fossem prefeitos e governadores, a pandemia estaria numa situação de descontrole ainda maior do que está.

Tribuna – O governo da Bahia e o prefeito de Salvador têm acertado nesse quesito?

Lídice – Muito boa. Agiram corretamente. Essa é a função do governante. Não tem nem porque ser destaque, porque essa é a prática de todos. Mas, como não está sendo, principalmente por causa do presidente da República, é algo louvável e a ser realmente festejado pelos baianos.

Tribuna – A senhora é pré-candidata à Prefeitura de Salvador. Faria algo diferente se estivesse no cargo? Tem alguma sugestão?

Lídice – Não. Isso é uma coisa que exige uma avaliação de casos e avaliações que eu não detenho no momento. Para mim, pelo que tenho acompanhado das decisões e da opinião dos especialistas, acho que eles, tanto o governador, quanto o prefeito, estão se comportamento de maneira correta.

Tribuna – Que estratégias os candidatos precisarão pensar, já que haverá menos aglomerações e contato físico?

Lídice – Isso vai depender de como estará a pandemia. Quem estiver fazendo qualquer plano que não leve em conta a necessidade de observar o avanço da pandemia, estará tomando a decisão errada. Nós, por enquanto, estamos fazendo o nosso mandato político via rede social. Então, todas as semanas temos reuniões com candidatos a vereadores, estimulamos o debate político sobre a cidade, também estamos discutindo programa de governo nessa direção. Então, é o que todos os candidatos farão. Ninguém poderá fazer mais. O candidato a prefeito, estando dentro da máquina da prefeitura, poderá estar tendo a possibilidade de uma movimentação maior.

Tribuna – Como estão as discussões com partidos da base aliada?

Lídice – Tenho conversado com todos. Conversado com o PT, com o PCdoB, com a Rede, com Bacelar [pré-candidato do Podemos]. Com a Rede e Bacelar, inclusive, vamos montar uma palestra para debater a cidade no período pós-pandemia.

Tribuna – O governador Rui Costa apoia a candidatura da Major Denice pelo PT. Temos informações de que ela é uma candidata que não agrada a base aliada, sobretudo por não ter um histórico de luta política. Como a senhora viu isso? Como viu essa escolha do governador?

Lídice – Isso aí é um problema do PT, do governador. Não me cabe analisar. Se o PT já escolheu numa conferência, é um problema interno do partido. O fato de ela não ter uma militância partidária, não quer dizer que ela não tenha uma militância partidária. Eu particularmente acho que para um cargo dessa complexidade, seria interessante ter também uma militância partidária. Mas isso não impede ninguém de ser candidato.

Tribuna – É o momento de reabrir o comércio?

Lídice – De jeito nenhum. Não é o momento de reabertura do comércio. Salvador está ainda com um alto índice de contaminação, embora tenhamos um número de mortes na Bahia abaixo de outros estados nordestinos. Isso não quer dizer que tenhamos que comemorar. Temos mais de mil mortos no nosso estados. Não podemos relaxar. É uma medida perigosa.

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