Política

“É provável que tenhamos uma aglutinação em torno de Wagner”, diz Florence

O deputado federal Afonso Florence (PT) se tornou uma das principais vozes da oposição contra o governo Jair Bolsonaro no Congresso Nacional

Por Guilherme Reis, Henrique Brinco e Paulo Roberto Sampaio Tribuna da Bahia

O deputado federal Afonso Florence (PT) se tornou uma das principais vozes da oposição contra o governo Jair Bolsonaro no Congresso Nacional. O baiano acredita que a falta de um isolamento social nacional, atraso na compra de vacinas e desmonte do SUS são componentes que agravaram a situação pandêmica do Brasil – que começa a semana com um patamar de 3 mil mortes diárias em média. Segundo ele, é preciso que o Governo Federal tome providências urgentes para evitar estragos ainda maiores. “Se a evolução do vírus nos mais jovens se alastre e for surgindo novas variantes, você passa a ter mais óbitos e passa a ter variantes que eventualmente atinjam e contaminem as faixas etárias já vacinadas e possa haver uma recontaminação”, declarou, em entrevista à Tribuna. Ainda no papo, Florence faz um balanço das ações do Governo da Bahia e da Prefeitura de Salvador durante a pandemia e traça um panorama eleitoral para 2022. Segundo ele, a possibilidade mais provável é que os partidos da base aliada se aglutinem em torno do nome do senador Jaques Wagner na corrida pelo Governo do Estado. “O PT tem uma decisão firme e tomada da pré-candidatura de Jaques Wagner ao Governo do Estado. A candidatura, você sabe, será dentro de um calendário que será estipulado nas convenções do ano que vem. A possibilidade de, na coalizão, se discutir outra candidatura que não a de Jaques Wagner, está posta.”


Tribuna da Bahia – Estamos vivendo um momento difícil no país com a segunda onda da pandemia. Qual é a sua percepção do cenário?

Afonso Florence – A situação está gravíssima com índices de óbitos e expansão da contaminação, inclusive com surgimento de novas variantes do vírus. E nós não temos a quantidade de vacinas necessárias e não temos uma coordenação nacional para o isolamento social, ainda muito necessário e talvez mais do que nas oportunidades anteriores. Portanto, é uma situação gravíssima, onde governadores e prefeitos atuais, mas o presidente da República tenta impedir o isolamento social – que é o ambiente para a expansão do vírus, colapsando também o SUS. São componentes que se combinam de forma negativa, contribuindo para o aumento da contaminação e aumento de mortes. O outro é a aquisição de vacinas. O governo recusou as vacinas oferecidas pela Pfizer em agosto do ano passado. A compra poderia ter sido feita e a reserva mantida e, assim que a liberação da Anvisa acontecesse, teria a encomenda. E a outra variável é a estruturação do SUS, desde a atenção básica nos municípios até os Estados, com o governo jogando contra.

Tribuna – Nos Estados Unidos a gente já vê pessoas jovens sendo vacinadas, enquanto aqui no Brasil sequer há previsão de quando as pessoas com menos de 50 anos serão imunizadas. Quais as principais consequências dessa demora?

Florence – A rigor, o que está sendo pesquisado: como o vírus está se expandindo demograficamente e como ele está atacando a saúde dos mais jovens. Existem muitas pesquisas em curso no mundo, inclusive sobre crianças. Há uma estabilização positiva, com redução da contaminação e dos óbitos entre os idosos e portadores de comorbidades. Claro que uma das hipóteses é que isso decorra já de um início de vacinação, apesar de um número não muito expressivo – estamos chegando na faixa de 10% da população vacinada. Se a evolução do vírus nos mais jovens se alastra e for surgindo novas variantes, você passa a ter mais óbitos e passa a ter variantes que eventualmente atinjam e contaminem as faixas etárias já vacinadas e possa haver uma recontaminação. O primeiro impacto é sanitário ainda. Claro que também há o impacto econômico, porque nós estamos falando da faixa etária economicamente ativa ainda não ter sido vacinada.

Tribuna – O senhor acha que o Governo da Bahia e a Prefeitura de Salvador têm acertado nas medidas?

Florence – Na Bahia, o Governo do Estado se antecipou. O governador Rui Costa tentou, em aeroportos e fronteiras rodoviárias, instalar a aferição de temperatura. O Governo Federal, contudo, tentou impedir. Tentou impedir através da ANAC que servidores do Estado estivessem no Aeroporto Dois de Julho [Salvador Bahia Airport] aferindo a temperatura dos turistas. Também o Governo Federal foi ao Supremo para tentar impedir os decretos. Considero que quase a totalidade dos prefeitos da Bahia e também a Prefeitura de Salvador cumpriram as medidas necessárias, sempre sofrendo ataques do grupo que apoia Bolsonaro e que obstrui decisões legislativas com relação, por exemplo, à renda emergencial. Eles agora baixaram o valor da renda emergencial – dizem que a faixa média será de R$ 200. Mas em 2020, Bolsonaro nem sequer mandou medida provisória criando o auxílio. O PT tinha um projeto chamado Mais Bolsa Família que propôs R$ 1045 e o grupo de Bolsonaro, então, criou um projeto de um deputado da base para propor R$ 200 e depois foi para R$ 600, sob muita pressão do Plenário. Até hoje não teve decreto de emergência, porque está preocupado em economizar, fazer ajuste fiscal. O orçamento de 2021, na proposta do governo, é de R$ 1 trilhão e 200 bilhões para pagamento de dívida. Não pode ter renda emergencial, Bolsa Família, aumentar o salário mínimo corrigido da inflação, mas pode pagar a dívida de R$ 1 trilhão e 200 bilhões. A estimativa é que 40 bilionários brasileiros lucraram R$ 72 bilhões só na pandemia. E cresce o número de brasileiros entre os bilionários do mundo. Isso numa pandemia! Quer dizer, o governo drena os recursos do orçamento para os bilionários, os banqueiros e barões, e não compra vacina, não estrutura o SUS e diz que o vírus pode ser resolvido com remédio veterinário que está matando as pessoas. As medidas que o governador e que os prefeitos baianos, e também o de Salvador, foram necessárias.

Tribuna – Mudando para política, o presidente Lula vai ser candidato em 2022?

Florence – Não se trata de acreditar. É a esperança. Essa última pesquisa da empresa de mercado, cujo dono virou um dos principais bilionários brasileiros, identifica que Lula já está na frente das pesquisas. A perseguição de [Sérgio] Moro contra Lula, a condenação ilegal e criminosa já está assumida pelo Supremo. Então, houve um golpe em 2016, uma perseguição contra Lula e um ataque ao PT. Lula agora tem elegibilidade e Moro que é o suspeito. Está provado no Supremo a suspeição de Moro. Então, considero que, do ponto de vista jurídico, ele estará elegível. Será uma decisão dele e do Partido dos Trabalhadores. Claro que tem quem queira que ele não seja candidato porque quer o apoio dele para ganhar. É do jogo da política. Tem gente querendo ser candidato com o apoio do PT porque sabe a força de Lula. Fomos para o segundo turno com Haddad em 2018 e quase ganhamos se não fosse Moro roubando no processo eleitoral, forçando uma delação premiada de [Antonio] Palocci sem provas. Todo mundo sabe o que Moro fez. Hoje não há dúvidas de que ele era um agente bolsonarista e um agente de interesses escusos. Considero que o mais provável é que ele [Lula] seja candidato.

Tribuna – O que achou da proposta de Ciro Gomes sugerindo que o ex-presidente Lula seja vice na chapa?

Florence – O Ciro tem se notabilizado com comportamentos esdrúxulos. No segundo turno de 2018 ele foi para o exterior e muitas pessoas do partido dele apoiaram Bolsonaro. Ele disse recentemente que o objetivo dele era derrotar o PT no primeiro turno. Ele queria, em 2018, que o PT pudesse ir com o seu candidato ao segundo turno, com ele. Ele não consegue ir para o segundo turno e acha que ganha se for com o apoio do PT. Não há nada que refute a decisão do Supremo que Moro é suspeito e Lula é inocente. E Ciro fica fazendo um tipo de discurso que parece que ele quer o apoio dos bolsonaristas, da direita. Agora ele inventou que Lula deve ser vice, provavelmente dele. Só que para ele ser o candidato com o apoio do PT, com o nome de Lula e de Haddad, tem que ter uma aproximação programática. Ciro tem que deixar de ser um satélite do bolsonarismo para ser alguém de fato da oposição. Ele tenta surfar num discurso de ódio dos bolsonaristas contra os direitos econômicos e sociais da maioria do povo brasileiro. Ele também tem que ter a robustez eleitoral. Ele tem que disputar liderando as pesquisas. Ele está na rabada e quer ser o candidato escolhido pelo PT. E, por último, tem que ter no mínimo educação doméstica, diplomacia, relações de cordialidade mínima de quem ele quer o apoio. A política tem uma máxima: quem quer apoio tem que estar disposto a apoiar! Então, Ciro faz um discurso do bolsonarismo, um discurso de ódio contra o PT quando as pesquisas apontam que o PT é o partido mais querido – e que Lula é o preferido, seguido por Haddad. Então, parece que ele está perdido. A biruta dele deixou de funcionar e parece que ele é a própria.

Tribuna – Aqui na Bahia, o que acha da possibilidade de lançar o senador Jaques Wagner para o Governo do Estado e Rui para o Senado?

Florence – É uma ótima ideia, só que nem todas as ideias são melhores que outras ótimas ideias. Temos uma aliança com o PSD, o PP, PCdoB e com o PSB e é óbvio que esse discurso de que o PT nunca topa apoiar não é verdade. Na Bahia, na penúltima eleição municipal [em Salvador] apoiamos o PCdoB. Há uma coalizão no governo Rui e eu considero que, tendo duas vagas na chapa majoritária, e ainda mais tendo apenas uma vaga para o Senado em um ano de reeleição para um senador com mandato, eu acho até indelicada cogitar essa hipótese. Considero uma ótima ideia, a princípio inexequível. A naturalidade é a da reeleição do senador Otto Alencar. Isso é natural. Não tenho dúvidas de que o PSD tem a habilitação política para dialogar conosco nessa chapa majoritária. Essa ideia é ótima porque reconhece os méritos da gestão do governador Rui Costa. Entretanto, na política, o PT tem que sentar na mesa com os partidos aliados e construir a aliança. São poucas vagas na majoritária.

Tribuna – Existe alguma possibilidade de o PT não estar na cabeça da chapa ao Governo do Estado ou apoiar outro partido? Ou lançar candidato é uma decisão já firme e tomada?

Florence – O PT tem uma decisão firme e tomada da pré-candidatura de Jaques Wagner ao Governo do Estado. A candidatura, você sabe, será dentro de um calendário que será estipulado nas convenções do ano que vem. A possibilidade de, na coalizão, se discutir outra candidatura que não a de Jaques Wagner, está posta. Essa possibilidade existe. Claro que, para todos os analistas, há a possibilidade da candidatura de Lula. Todo mundo sabe que, no Brasil, Jaques Wagner sempre foi e cada vez mais é um dos mais próximos líderes de Lula. Tem estatura nacional, de estadista e poderia ser candidato a presidente. Então, as condições políticas apontam para um crescimento das variáveis que dão densidade política e eleitoral. Ele tem o recall de ter sido o candidato vitorioso em duas eleições no primeiro turno e ter saído com alto índice de popularidade, além de ter feito sucessor e ter sido ministro de Lula e Dilma. Claro que tem o nome de Otto, de João Leão… O PCdoB tem nomes, o PSB tem nomes… A possibilidade existe, mas o PT colocou a sua pré-candidatura. Ela é muito robusta e é provável que tenhamos uma aglutinação em torno do nome de Jaques Wagner se houver a confirmação desse cenário.

Tribuna – Qual mensagem o senhor deixa para os baianos?

Florence – Quero enfatizar a importância de soluções de curto prazo no combate à pandemia e ao impacto econômico da pandemia. Precisamos resolver o tema das vacinas. É um absurdo que a Anvisa fique obstruindo a concretização da ação da vacinação por parte do Consórcio Nordeste, presidido pelo governador do Piauí. É nítido que é uma obstrução política do presidente Bolsonaro, que está na faixa dos 90 processos de abertura de investigação por crime de responsabilidade – que a gente chama de impeachment. Precisamos que a opinião pública se manifeste, que os editorialistas, os âncoras, os órgãos se manifestem para que o governo pare de atrapalhar o combate ao Covid. Fazer propaganda de remédio veterinário, que é prejudicial e está matando. Que o governo pague o auxílio emergencial com um valor menos achatado. Tinha que ser os R$ 600 durante o período de pandemia e não R$ 200 por quatro meses. O governo também tem que aprovar novas linhas de crédito para as micro e pequenas empresas. O Brasil quer fazer ajuste fiscal, cortar salário do trabalhador, do setor público, não abrir linha de crédito para as empresas e cooperativas. O presidente da República e seu governo joga contra o Brasil o tempo todo. Minhas últimas palavras são no sentido que todos nos unamos, independente de orientação política, não é contra e nem oposição ao governo Bolsonaro, mas em favor de ações governamentais coordenadas para combater o vírus, vacinar a população e tomar providências para garantir a renda das famílias mais pobres. E todo mundo ficar atento aos pedidos de impeachment e averiguar qual é o grupo política que dá sustentação [ao governo].

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