
Forças iranianas lançam mais de 100 mísseis balísticos contra a metrópole israelense. Governo de Benjamin Netanyahu adverte que Teerã “cruzou todas as linhas vermelhas” e mobiliza reservistas. Israel volta a bombardear o país inimigo
Depois de avisar que abriria “as portas do inferno” e de prometer uma resposta decisiva, o Irã lançou mais de 100 mísseis balísticos contra Israel, que contra-atacou poucas horas depois. O ataque iraniano conseguiu romper o Domo de Ferro e atingir Tel Aviv, sacudida por várias explosões. Retaliações sucessivas provocaram uma escalada de tensão com panorama de guerra aberta, lançando o Oriente Médio no perigo de um conflito regional. O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, avisou que a campanha bélica contra o inimigo “durará dias” e estava “só começando”. O ministro da Defesa, Israel Katz, disse que o Irã “cruzou todas as linhas vermelhas” com o disparo dos mísseis e anunciou que todos os reservistas foram posicionados em “arenas de combate” espalhadas pelo país.
Na madrugada desta sexta-feira (13/6), as Forças de Defesa de Israel (IDF) realizaram uma ofensiva sem precedentes contra instalações militares, atômicas e de processamento de urânio. Também cometeram assassinatos seletivos contra seis cientistas do programa nuclear e altos comandantes iranianos, entre eles, o chefe da Guarda Revolucionária, general Hossein Salami; e o chefe do Estado Maior, Mohammad Bagheri. O ministro das Relações Exteriores, Abbas Araghchi, ignorou os pedidos de moderação feitos pela comunidade internacional e anunciou a retirada das negociações sobre o programa nuclear. “Teerã rejeita os apelos por moderação dirigidos ao Irã após a agressão israelense”, declarou.
Por volta das 21h10 desta sexta-feira no horário local (15h10 em Brasília), as IDF ordenaram a toda a população israelense que se protegesse. Pouco antes, o aiatolá Ali Khamenei fez um pronunciamento transmitido em rede nacional de televisão. “O regime sionista cometeu um grave e grande erro, cometeu um ato imprudente. Pela graça de Deus, as consequências disso levarão o regime à ruína. A nação iraniana não permitirá que o sangue de seus valorosos mártires não seja vingado”, advertiu o guia supremo do Irã. “Nossas Forças Armadas estão prontas. (…) Todos sentem que devemos dar uma forte resposta à entidade sionista maligna, desprezível e terrorista. Se Deus quiser, responderemos com força e não mostraremos misericórdia. A vida definitivamente se tornará mais amarga para eles. (…) Eles começaram uma guerra”, acrescentou.
Até a noite de sexta-feira, o Irã confirmava 78 mortos e mais de 320 feridos nos ataques. Por sua vez, Israel contabilizou 63 feridos e uma mulher morta. Netanyahu reagiu ao primeiro ataque iraniano com ameaças e com uma mensagem de vídeo dirigida ao “nobre povo” do país persa. “Chegou o momento de o povo iraniano se unir em torno de sua bandeira e de seu legado histórico, defendendo sua liberdade frente ao regime maligno e opressor”, declarou. Ele elogiou a ofensiva militar da madrugada, ao classificá-la como “uma das maiores operações militares da história”. “Esperamos estar expostos a várias ondas de ataques iranianos”, alertou.
Principal aliado de Netanyahu, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, confirmou que foi avisado com antecedência sobre os ataques israelenses ao Irã e fez um alerta ao regime persa. Na manhã de ontem, o republicano instou Teerã a fechar um acordo sobre o programa nuclear “antes que seja tarde demais” e avisou que “as próximas ações planejadas por Israel serão ainda mais brutais”.
Brasil
Enquanto disparava mísseis contra Israel, Netanyahu conversava com vários líderes mundiais, entre eles, o próprio Trump e os presidentes Emmanuel Macron (França) e Vladimir Putin (Rússia). Em nota, o governo brasileiro expressou “firme condenação” e disse acompanhar com “forte preocupação” a ofensiva aérea israelense, além de denunciar “clara violação à soberania desse país e ao direito internacional”. “Os ataques ameaçam mergulhar toda a região em conflito de ampla dimensão”, advertiu a nota do Itamaraty, que instou as partes à máxima contenção.
Especialista em política externa, o iraniano-americano Trita Parsi garantiu: “Há uma guerra total entre Israel e Irã”. “A questão é se ela se expandirá rumo a um conflito regional, que começará com um ataque dos EUA ao Irã e com uma resposta do Irã contra bases americanas espalhadas pelo Oriente Médio”, afirmou ao Correio.
Eytan Gilboa, professor de relações internacionais da Universidade de Bar-Ilan, em Ramat Gan (perto de Tel Aviv), disse ao Correio que espera uma escalada, mas não acredita em uma guerra de semanas ou meses entre os dois países. “Isso provavelmente terminará em um cessar-fogo com o Irã e com o Hamas”, avaliou, ao citar o grupo terrorista palestino. Para o estudioso, o mais surpreendente envolvendo o ataque israelense, na madrugada, foram os assassinatos de comandantes e oficiais de alta patente do regime. “O Mossad (serviço secreto israelense) teve papel importante, pois estabeleceu uma base de operações no Irã”, observou.
Segundo Gilboa, o propósito da ofensiva de Israel parece ser a derrubada do regime iraniano. “Há uma oposição muito forte aos aiatolás dentro do Irã e uma simpatia por Israel entre parte da população. A oposição demonstrou satisfação pelos ataques às instalações nucleares. Isso poderia inspirar uma rebelião interna”, explicou. “Talvez isso seja uma espécie de estopim para um movimento contra o regime, similar ao que ocorreu na Síria. É óbvio que os bombardeios enfraquecerão o regime.”
Professor de relações internacionais da Universidade de Nova York e especialista em Oriente Médio, Alon Ben-Meir vê o risco real de um espalhamento do conflito. “Embora os países do Golfo Árabe possam comemorar discretamente a destruição que Israel infligiu ao Irã, eles agora estão apreensivos e com medo de serem arrastados para uma guerra que não desejam”, disse à reportagem. “Qualquer guerra regional terá grandes ramificações econômicas e prejudicarão o desenvolvimento do Oriente Médio, com a interrupção de suas exportações de petróleo.”
Ben-Meir não crê em uma capitulação do Irã. “Independentemente de quão esteja debilitado pela campanha de Israel de reduzir a influência do eixo de resistência do regime — formado pelo Hezbollah e pelo Hamas —, o Irã permanece como uma formidável potência militar e não vai se render. Sugerir que o aiatolá prosseguirá com as negociações, depois de ser humilhado, é uma tolice”, disse ao Correio.
Infiltração do Mossad e drones suicidas
O ataque contra o Irã, na madrugada de ontem, foi planejado durante meses e teve nuances cinematográficas. Equipes do Mossad, o serviço secreto de Israel, esconderam drones com explosivos e bombas em carros descaracterizados e penetraram o território iraniano. As aeronaves não tripuladas foram comandadas remotamente pelos agentes; algumas delas acabaram detonadas na fachada de prédios residenciais, diante das janelas de apartamentos onde moravam comandantes da Guarda Revolucionária, cientistas nucleares e comandantes militares. A chamada “Operação Leão Ascendente” teve a participação de equipes de inteligência clandestinas e contou com munições pré-posicionadas em território iraniano durante semanas ou meses. As informações foram divulgadas pelo jornal The Washington Post, que citou fontes militares de Israel.
A primeira onda de ataques compreenderia a eliminação de chefes da Guarda Revolucionária em locais conhecidos com antecedência por Israel. Horas depois, a operação se expandiu para ataques com mísseis contra instalações militares e nucleares. Os planos do Mossad se aceleraram nos últimos meses e foram finalizados no momento em que o Irã e os Estados Unidos negociavam um acordo sobre o programa nuclear.
Fonte: Correio Braziliense